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Vol. 6. Issue 1.
Pages 77-80 (January - February 2000)
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Vol. 6. Issue 1.
Pages 77-80 (January - February 2000)
AS NOSSAS LEITURAS/OUR READINGS
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Tratamento a longo prazo com budesonido inalado em pessoas com doença pulmonar obstrutiva crónica, que mantêm hábitos tabágicos
Long-term treatment with inhaled budesonide in persons with chronic obstructive pulmonary disease who continue smoking
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R.A. Pawels, C.-G. Lödahl, L.A. Laitinen, J.P. Schouten, D.S. Postma, N.B. Pride, S.V. Ohlsson, For the European Respiratory Society Study on Chronic Obstructive Pulmonary Disease (EUROSCOP)
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RESUMO

A Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC) é caracterizada por uma limitação progressiva e predominantemente irreversivel do débito das vias aéreas. O declinio da função pulmonar na DPOC relacionase com a presenya de alteraçõs inflamatórias nas vias aéreas e no parênquima pulmonar. A intlamação das vias aéreas na DPOC difere da que ocorre na asma. Os glucocorticóides inalados são usados com sucesso na asma e alguns estudos de monstraram um efeito destes fármacos na intlamação das vias aéreas na DPOC. Neste estudo, os autores testaram a hipótese de que um tratamento regular com budesonido inalado poderia reduzir a taxa de declínio da função pulmonar em doentes com DPOC ligeira que mantinham os habitos tabágicos.

Tratouse de um estudo multicêntrico aleatorizado, controlado com placebo, em dupla ocultação, que incluiu 1277 doentes, com idade media de 52 anos, sendo 73% do sexo masculino, fumadores de uma média de 39 UMA, com um volume expiratório máximo no 1° segundo (FEV 1) médio de 77% do valor teórico e uma fraca reversibilidade a 1mg de terbutalina inalada (em média: 2.85% do valor teórico). Foram medicados com 400μg duas vezes por dia ou placebo, inalados através de um sistema de inalador de pó seco (Turbuhaler), durante um período de três anos.

Nos 912 doentes que completaram o estudo, verificouse um declínio médio do FEV1 pós-broncodilatador de 140ml no grupo do budesonido e de 180ml no grupo placebo, no final dos 3 anos (p=0.05). Nos primeiros 6 meses do estudo, o FEV1 melhorou 17ml/ano no grupo do budesonido e teve um declínio de 81 milano no grupo placebo (p<0.001). Do nono mês até ao final do tratamento, o declínio do FEV1 foi paralelo nos dois grupos (respectivamente -57ml/ano vs -69ml/ano, p=0.39). O budesonido teve urn efeito benéfico mais notório nos doentes com menor carga tabágica ( 36 UMA), a saber, um declinio de 120ml no grupo do budesonido contra um declínio de 190ml no grupo placebo durante os 3 anos do estudo (p<0.001). Percentagens similares de doentes (cerca de 10%) suspenderam os hábitos tabágicos nos dois grupos, pelo que a evicçã tabágica não explica a diferença encontrada oa variacção do FEV1.

A avaliação da segurança permitiu detectar no grupo do budesomdo, maíor número de equimoses (10% versus 4%, p<0 001), de candidíase e de irritação da orofaringe, não se verificando diterenças nos dois grupos quanto à ocorrência de outros efeitos secundános, como a hipertensão recentemente diagnosticada, as fracturas ósseas, as cataratas póscapsulares, a miopatia ou a diabetes (< 5% nos 2 grupos, p>0.36).

Os autores conclucm que o eteito global do tratamento com budesonido nos doentes com DPOC nos 3 anos de estudo foi limitado, quando comparado com o efeito que é obtido nos doentes asmáticos O pequeno efeito benéfico na função pulmonar que ocorre no inicio do tratarnento e o possivel efeito benético mais pronunciado no subgrupo de doentes com menor carga tabágica, devem ser contrabalançados com o risco de efeitos secundáios locais e sistémicos.

Palavras-chave:
Corticosteróides inalados
Doença pulmonar obstrutiva crónica
COMENTÁRIO

O processo innamatório que envolve as vias aéreas na asma e na DPOC em tase clinicamente estável é diferente, predominando na asma os linfocitos CD4+, os eosinófilos e os mastócitos, enquanto que na DPOC, o infiltrado inflamatório é sobretudo composto por neutrófilos, macrófagos e linfocitos CD8+. A eosinofilia das vias aéreas não é patognomónica da asma, ocorrendo também nas exacerbações da DPOC (1).

A reversibilidade aos corticosteróides na DPOC é encontrada em cerca de 10 a 15% dos doentes (2). O número de neutrófilos obtido a partir do liquido do lavado brônquico correlacionase com o grau de limitação da função pulmonar e com a carga tabágica (3). O tratamento de doentes com DPOC com 1500μg de dipropionato de beclomctasona por dia durante 2 meses, induziu uma redução de 27% dos neutrófilos e de 42% do total de células nas amostras obtidas por expectoração induzida, mas não teve qualquer efetto nos parametros espirométricos (4).

A reversibllidade obtida em 12 dos 25 doentes com DPOC submetidos a um curso de 1.5mg/kg/dia de prednisolona durante 15 dias, definida como um aumento do valor de FEV1 de pelo menos 12% com um aumento absoluto200ml, correlaciona-se com um número significativamente aumentado de eosmófilos na biópsta pulmonar, valores mais elevados de proteína catiónica do eosinófilo no liquido do lavado bronco-alveolar e um espessamento marcado da membrana basal reticular, comparativamente aos doentes que não responderam a esta terapêutica (5).

A reversibllidade aos corticóides na DPOC parecc pois relacionarse com marcadores que são comuns na asma. Outros estudos demonstram que os corticóides inalados não afectam o número de macrófagos recuperado pela expectoração induzida, mas reduzem o número de neutrófilos e melhoram outros parâmetros inflamatórios como a extravasão de macromoléculas e proteinas plasmáticas para as vias aéreas (SAETTA M, comunicação oral, Lisboa 1999).

Os efeitos a curto prazo do tratamento com corticosteróides orais nas exacerbações da DPOC, com beneficio clinico signficativo e encurtamento da estadta hospitalar foram demonstrados em dois estudos recentes (6,7). A prescrição de corticóides orais no tratamento das exacerbações da DPOC (ex: 40mg de prednisolona/dia ou equivalente durante 2 semanas) é aconselhada nas recomendações preliminares do projecto GOLD (Global lmllative for Obstructive Lung Disease), não sendo recomendado o seu uso crómco em doentes estáveis, pela má relação beneficios/riscos.

Nos últimos anos têm sido publicados múltiplos estudos que utilizam os corticóides inalados em doentes com DPOC, visando em particular os efettos a curto prazo, em pequenos grupos de doentes Contudo, sendo a taxa de declínio acelerado da função pulmonar, um dos factores que tem maior peso predictivo ncgativo na evolução desta doença, as atenções estao agora voltadas para os efeitos destes fármacos a longo prazo e em grandes grupos de doentes. Uma meta-análise publicada recentemente demonstra uma evolução benéfica do FEV1 durante dois anos de tratamento com doses relativamente altas de corticóides inalados (800 e 1500μg de beclometasona ou 1600μg de budesonido diariamente) (8).

Três grandes estudos avaliaram o efeito dos corticóides inalados na taxa de declinio do FEY 1 num periodo de 3 anos. No Copenhagen City Lung Study foi recrutada da comunidade uma coorte de 290 doentes com DPOC Ugeira (FEV1 médio: 2.5L), que após um tratamento inicial com budesonido em altas doses, recebeu 800μg de budesonido/dia. Não se observou diferença na taxa de decllnio da função pulmonar entre o grupo tratado activamente e o grupo placebo (9). O estudo EUROSCOP, aqui apresentado, envolveu doentes com obstrução ligeira a moderada, e demonstrou uma melhoria significativa do FEV1 nos primeiros 3 a 6 meses de tratamento com budesonido inalado. Contudo, no restante periodo do estudo, o declinio do FEV1 foi idêntico ao observado no grupo placebo. No estudo ISOLDE (Inhaled Steroids in Chronic Obstructive Lung Disease in Europe), os 990 doentes envolvidos tinham uma DPOC grave, com FEV1 de cerca de 1.3L. Tal como no EUROSCOP, verificouse uma melhoria do FEV1 pós-broncodilatador nos primeiros 3 a 6 meses após o tratamento com corticóide inalado, desta vez com fluticasona 500μg duas vezes por dia, não se verificando diferenças na taxa de declinio após esta melhoria. Tratando-se de doentes com maior gravidade, apresentavam a priori grande numero de exacerbações, tendo o grupo tratado com fluticasona reduzido em 25% a taxa de exacerbações nos 3 anos do estudo. O estudo ISOLDE avaliou também os parâmetros de qualidade de vida relacionada com a saúde, através do questionário respiratário de St. George (de Paul Jones), verilicandose que o tratamento com fluticasona reduziu significativamente a taxa de declinio do estado de saude, no que concerne os sintomas, a actividade eo impacto da doenva (10).

Uma análise conjunta destes 3 estudos, poderá dar-nos o "espectro" da resposta aos corticóides inalados. seleccionando os doentes em estadio moderado a grave, como aqueles que aparentemente mais beneficiarão com esta terapêutica. Não existindo marcadores biológicos de fácil acesso que possam predizer a resposta à corticoterapia, as indicações terapêuticas devem ser o mais possível baseadas na evidência, ou seja nos efeitos documentados na função pulmonar e na qualidade de vida. As recomendaçõoes do projecto GOLD para a terapēutica com corticóides inalados são:

Os doentes com DPOC moderada, que mantêm sintomas e limitação do débito aéreo, apesar do tratamento regular com broncodilatadores, devem receber um tratamento de 3 meses com doses moderadas de corticóides inalados. Quando é possivel demonstrar uma reversibil idade significativa e consistenle do FEV1 (pelo menos 200ml) medido após broncodilatação, a corticoterapia inalada deve ser mantida.

Os doentes com exacerbações frequentes (uma ou mais exacerbações por ano), bem como os doentes com DPOC grave, devem receber corticoterapia inalada regularmente (Pauwels R. Workshop GOLD; ERS 1999).

As recomendações anteriores que sugeriam recorrer a curtos periodos de corticoterapia oral para predizer a resposta a corticoterapia inalada a longo prazo serão retiradas do conj unto das recomendações actuais, wna vez que o estudo ISOLDE provou que a resposta a primeira destas terapêuticas não prediz à resposta a última e por outro Jado, receiase que os doentes continuem a automedicar-se ab eternum com a corticoterapia oral.

Key-words:
Corticosteroids
Chronic obstructive pulmonary disease
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BIBLIOGRAFIA
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P.S. Burge.
EUROSCOP, ISOLDE and the Copenhagen City Lung Study Thorax.
Thorax, 54 (1999), pp. 287-288

N Engl J Med 1999; 340: 1948-53

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